Arte periférica e comunicação popular caminham juntas

Nas periferias, a arte e a comunicação andam de mãos dadas para promover acesso à informação, reflexão crítica e mobilização social

Informação que comunica é aquela que toca, conecta e circula. Não é de hoje que a arte, com sua multiplicidade de formatos e linguagens, é aliada da comunicação. Brasil afora, coletivos de periferia têm dominado práticas artísticas que se transformam em estratégias comunicativas autônomas e sensíveis às realidades locais.

No Maranhão, acompanhamos o Reocupa, coletivo que realiza ações artístico-culturais para mobilização social. Este ano, produziram um mural em grafite junto a artistas parceiros, no muro de uma escola de São Luís, para fomentar a discussão sobre crise climática. Para o segundo semestre, o coletivo segue com um projeto de empena e intervenções artísticas focadas na Amazônia Legal. “Acreditamos que o grafite tem o poder de comunicar questões sociais e ambientais de maneira direta, sensível e transformadora”, destaca Kadu Vassoler, um dos coordenadores do projeto. “Além disso, a iniciativa contribui para a revitalização de espaços públicos e para a promoção da identidade cultural local.”

Durante crises, esse tipo de comunicação ganha ainda mais força. Na pandemia, por exemplo, ações como a coalizão #CoronaNasPeriferias provaram que materiais criados com linguagem local — como vinhetas, lambe-lambes e conteúdos digitais — salvaram vidas ao distribuir informação confiável nos territórios.

A criação de narrativas com linguagens próprias permite que comunidades interpretem e ressignifiquem os conteúdos que normalmente chegariam apenas pelas mídias institucionais. Funciona também como uma estratégia transmídia. Em vez de apenas replicar o conteúdo, cada meio (vídeo, poesia, mural, podcast, reportagem, performance etc.) contribui com uma parte nova da narrativa, ampliando a experiência de quem consome — e, principalmente, de quem participa da criação.

No contexto das periferias, essa abordagem permite que artistas e comunicadores ocupem diversos espaços de circulação da informação — das redes sociais aos muros da quebrada, dos saraus às rádios comunitárias — usando múltiplas linguagens para engajar, informar e mobilizar.

Aqui na Énois acompanhamos e fomentamos o trabalho de pessoas que caminham de mãos dadas com a arte e a comunicação desde nosso surgimento. Em diferentes momentos, em slams e saraus, levamos informações apuradas e embasadas, por meio de formações ou ações culturais. “Disputamos, inclusive, o nome jornalismo, que vem carregado de um formato, formalidade e distanciamento”, comenta Simone Cunha, diretora de sustentabilidade da Énois. 

“A arte é uma ferramenta de combate para chegar às pessoas e fazer parte de suas vidas ao escutar, conectar e emocionar. São atributos que estão em falta no ecossistema tradicional de informação, mas que são essenciais quando a gente tem a função social de fortalecer o tecido social, aquilo que o jornalismo busca fazer”, completa Simone.

Equipe Énois, participantes e facilitadores do Arte é Informação no espaço das Travas da Sul, no Grajaú, zona sul de São Paulo. Crédito: Divulgação/Énois


Foi com essas premissas que colocamos de pé o Arte é Informação, projeto novo da Énois que mira em promover encontros para que artistas periféricos acessem conhecimentos sobre justiça climática, comunicação, jornalismo e profissionalização. Os encontros aconteceram em São Paulo, nos bairros do Grajaú, Brasilândia, São Mateus e Paraisópolis, nos meses de julho e agosto.

Não se trata apenas de distribuir conteúdo. É sobre traduzir temas urgentes como crise climática, racismo ambiental e direitos básicos em linguagens acessíveis, emocionantes e enraizadas. E isso é importante para o desenvolvimento de sujeitos críticos e informados, com autoestima e laços coletivos reforçados.

“A formação sobre clima e periferia me fez pensar na intersecção entre arte e clima e em como podemos comunicar essa grande questão que chega nas periferias. Saber mais sobre a Lei de Acesso à Informação me fez entender que tenho o direito de saber, e vai me ajudar a fazer minhas próprias pesquisas”, compartilhou DasNuvens, grafiteira e produtora cultural que participou do encontro em São Mateus.

Ao lado de artistas como Soberana Ziza (@soberanaziza)Brisa Flow (@brisaflow)APÊAGÁ (@apoetapeaga) e Mano Mike (@manomikemc), os encontros do projeto revelaram como a arte comunica o território e ressignifica espaços desvalorizados — transformando paredes em telas, ruas em galerias vivas e a comunicação em construção coletiva. As oficinas com Nazura, sobre portfólio e autoestima profissional, e com Lucas Veloso, sobre jornalismo de quebrada, fortaleceram práticas de documentação e apresentação do trabalho artístico como forma legítima de informação. Já a formação sobre crise climática e racismo ambiental, com Amanda CostaGabriela Alves e Mahryan Sampaio, conectou arte, política e território a partir da vivência das juventudes periféricas.

Equipe Énois, participantes e facilitadores do Arte é Informação no espaço do São Mateus em Movimento, em São Mateus, zona leste de São Paulo. Crédito: Divulgação/Énois


Para Kevin Nascimento, fotógrafo da Brasilândia que participou dos encontros, “todo artista que trabalha com imagem também deveria ter esse viés da comunicação com a arte, porque é comunicar sua quebrada, seu bairro, onde você mora, através da arte.”

A escolha dos territórios do Grajaú, Brasilândia, São Mateus e Paraisópolis não foi aleatória. São espaços pulsantes de produção cultural, organização política e narrativas próprias. As atividades aconteceram em parceria com os coletivos locais Travas da Sul, PiPA, São Mateus em Movimento e Estúdio 7 Notas, com parceria do Programa Einstein na Comunidade de Paraisópolis (PECP) e financiamento do Consulado da Alemanha e da emenda parlamentar municipal de São Paulo.

Equipe Énois, participantes e facilitadores do Arte é Informação no espaço PEC (Programa Einstein na Comunidade de Paraisópolis), em parceria com Estúdio 7 Notas, zona sul de São Paulo. Crédito: Divulgação/ Énois

Ao reunir artistas, comunicadores e lideranças locais, o projeto reforça que a arte periférica é uma estratégia concreta de comunicação comunitária, capaz de gerar informação confiável, fortalecer identidades, promover engajamento e influenciar políticas públicas. Nas falas, grafites, poesias e músicas, vimos uma comunicação feita de corpo presente, com escuta, responsabilidade e pertencimento.

Acompanhe os próximos passos do Arte é Informação nos canais da Énois e siga com a gente fortalecendo essa rede. Que tal buscar os artistas periféricos do teu território, acessar seus trabalhos e ampliar seus trabalhos?